A doença de Alzheimer foi descoberta a mais de 100 anos pelo médico alemão Alois Alzheimer. Ainda segue sem nenhuma proposta eficaz e segura de cura, apesar do grande avanço científico das neurociências nas últimas décadas. Entretanto, uma pesquisa divulgada nesse último mês (novembro, 2022) na revista Nature, um grupo de cientistas do Instituto Tecnológico de Massachusetts (EUA) publicou uma extensiva investigação sobre a relação entre o metabolismo cerebral do colesterol e o desenvolvimento dessa doença neurodegenerativa, sugerindo, então, novos alvos terapêuticos. Utilizando amostras post-mortem do córtex frontal de pacientes que portavam ou não a variante APOE4, os autores observaram, por meio da técnica de sequenciamento de RNA de célula única (single-cell RNAseq), que o metabolismo do colesterol, principalmente nos oligodendrócitos (célula responsável pela formação e manutenção da bainha de mielina), está alterado. O gene da APOE codifica a Apolipoproteína E, cuja principal função é facilitar o transporte da molécula de colesterol pelo organismo. Com isso, os cientistas reforçam estudos prévios que também apontam o acúmulo de gordura (ácidos graxos) intracelular no sistema nervoso central como mecanismo fisiopatológico da doença de Alzheimer. Nesse estudo, por meio de imagens obtidas por microscopia eletrônica, indivíduos com a mutação no gene da APOE4 também apresentaram redução da espessura da bainha de mielina. Nesse estudo, de caráter translacional, análises em células e em animais (camundongos) knockout para APOE4 demostraram efeitos de causalidade entre distúrbios na biossíntese no transporte intracelular de ésteres de colesterol nos oligodendrócitos, com prejuízos no processo de mielinização. Apesar disso, tais efeitos foram posteriormente revertidos utilizando-se de uma intervenção farmacológica com ciclodextrina (um facilitador de transporte do colesterol). Com isso, os autores sugerem que intervenções com o objetivo de melhorar o fluxo de colesterol dentro das células, principalmente dos oligodendrócitos, são promissoras no tratamento e prevenção da doença de Alzheimer e, talvez, outras formas de doenças neurodegenerativas em que haja perda do volume e da integridade da bainha de mielina como processo patológico.
1 - Blanchard JW, Akay LA, Davila-Velderrain J, von Maydell D, Mathys H, Davidson SM, Effenberger A, Chen CY, Maner-Smith K, Hajjar I, Ortlund EA, Bula M, Agbas E, Ng A, Jiang X, Kahn M, Blanco-Duque C, Lavoie N, Liu L, Reyes R, Lin YT, Ko T, R'Bibo L, Ralvenius WT, Bennett DA, Cam HP, Kellis M, Tsai LH. APOE4 impairs myelination via cholesterol dysregulation in oligodendrocytes. Nature. 2022 Nov;611(7937):769-779.